Deus cura e salva

Deus cura e salva

Um sacerdote dizia há tempos numa homilia que hoje não há curas nem milagres. Isso era no tempo de Jesus em que as pessoas não conheciam a ciência e, por isso, esperavam de Deus aquilo que podemos esperar hoje do conhecimento. E acrescentava: “As curas hoje acontecem nos hospitais e são fruto do trabalho da ciência. Os milagres são o trabalho com os pobres, aquilo que se consegue alcançar com a solidariedade social e a partilha.» Alguém que estava nessa missa sentiu que aquilo, tendo uma pequena parte de verdade, pois de facto Deus cura através da ciência e dos médicos e há maravilhas que são realizadas no mundo através da doação e da entrega de tanta gente generosa em favor dos mais pobres, era extremamente redutor, e anti–evangélico. Foi à sacristia e disse ao padre: Desculpe, senhor padre, mas fiquei incomodada com as suas palavras: «No fundo o que o Senhor disse é que Jesus está morto e hoje só nos resta d’Ele um conjunto de bons ensinamentos éticos. Mas essa não é a minha fé e creio que também não é a fé da Igreja.» E de facto não é isto que o Evangelho nos diz e não é esta a tradição viva da Igreja. Deus diz: «Eu sou o Senhor que te cura» (Ex 15,26) e a palavra hebraica para dizer cura é «sozdo» que quer dizer salvar e curar ao mesmo tempo. Deus cura salvando, atingindo não só a alma, mas muitas vezes o corpo.

Um quarto dos evangelhos é a narrativa das curas de Jesus. O Evangelho de hoje é um desses relatos entre tantos. S. Mateus expressa-o assim: “Jesus começou a percorrer toda a Galileia, ensinando nas sinagogas, proclamando o Evangelho do Reino e curando entre o povo todas as doenças e enfermidades.” (Mt 4, 23) Mas Jesus não se contentou em curar no seu tempo: disse aos seus seguidores: «vós fareis também estas coisas e até maiores do que estas porque eu vou para o Pai.» Quando envia os 72 discípulos (não só os Doze), diz-lhes: “Em qualquer cidade em que entrardes e vos receberem, comei do que vos for servido, curai os doentes que nela houver e dizei-lhes: ‘O Reino de Deus já está próximo de vós’.” E, de facto, nos Atos dos Apóstolos, os discípulos fazem o que Jesus lhes mandou e exercem o ministério de cura em nome de Jesus, manifestando assim que Jesus ressuscitado está com eles. A Igreja ao longo dos séculos nunca deixou de exercer o ministério da cura.

Porque é que Jesus cura? Os evangelistas quando falam das curas que Jesus realiza afirmam quase sempre que “Jesus encheu-se de compaixão”. O que leva Jesus a atuar é, em primeiro lugar, ele achar intolerável que alguém sofra daquele modo. Fica compadecido e estende a Sua mão salvadora. Mas as curas são também um anúncio jubiloso de que o Reino de Deus já está no meio de nós. Podemos dizer que O Reino de Deus é como que a esfera de influência de Deus. Quando a esfera de influência de Deus for total e completa – como será um dia – então não vai haver mais doença. Por isso, existe um aspeto futuro do Reino. A Bíblia fala-nos de um novo céu e uma nova terra onde não haverá mais cancro, não haverá mais sofrimento, não haverá mais dor, mais lágrimas, mais morte. Haverá cura total para toda a gente. Mas agora, nem toda a gente é curada ainda, pois se é verdade que, com Jesus, o Reino de Deus já está no meio de nós, ainda não está na sua plenitude pois aguardamos a segunda vinda de Cristo. S. Paulo diz assim: «Nós gememos no nosso íntimo» – porque todos os nossos corpos estão em declínio, aguardando a adoção filial, a libertação do nosso corpo.» A libertação total dos nossos corpos só acontecerá no futuro. Por isso, quando alguém é curado hoje pelo poder da fé, é um anúncio do futuro que está a acontecer. No futuro vai ser assim…todos serão curados.

E no presente? Aquilo que os homens podem fazer pela ciência médica é com eles, mas podemos e devemos sempre rezar pelos médicos para que sejam instrumentos de Deus curando e aliviando a dor psíquica e física, mas a oração faz sempre bem ao doente que vai ser operado ou que acabou de receber uma notícia de que tem uma doença grave. O medo angustia-nos e deprime-nos. A oração liberta e dá força. A Igreja aconselha as pessoas a receberem a unção dos doentes antes de irem para uma intervenção cirúrgica para irem com a confiança da fé. Nós devemos rezar em todas as circunstâncias pelos que sofrem e pedir a Deus a cura total da pessoa. Deus é soberanamente livre para agir segundo a sua infinita sabedoria, ou dando a força e graça interior para se unir à Cruz do Senhor, ou curando a doença para manifestação do seu Reino. A pessoa curada que se volta para Deus e viu nisso a sua misericórdia mudando de vida, não foi só curada, foi salva. A pessoa que foi curada, mas não reconheceu o Senhor voltando-se para Ele, foi curada, mas não salva. No evangelho de hoje nove foram curados, mas um deles recebeu mais do que a cura, reconheceu o seu Salvador e a vida dele passou a ter outra dimensão. A comunidade cristã deve acreditar mais no poder salvador de Jesus e voltar-se para ele para rezar comunitariamente pelos que sofrem. Quanto mais rezar pelos doentes mais maravilhas verá e a sua fé crescerá, pois perceberá que Jesus está vivo e atuante no meio dela.

Pe Jorge Santos

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